segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Um Pecado Colorado


Apesar de não praticar mais o catolicismo com o qual cresci, ainda lembro quais são os dez mandamentos. Não irei lista-los aqui porque acredito que todos saibam quais são, mesmo quem segue outras religiões. No entanto, na religião do Internacional parece haver um 11º mandamento: “Não tomarás gol no fim da partida”. E para o azar de quem segue a religião colorada, este é um mandamento que têm trazido consequências frustrantes, para dizer o mínimo.

Não posso dizer que faltou entrega ao Inter no jogo contra o Flamengo, que transcorreu sem maiores problemas ontem, durante um quente início de noite em Porto Alegre. O time foi valente e em alguns momentos surpreendeu até o mais pessimista dos colorados, que talvez esperasse uma grande derrota frente ao time carioca, que possui hoje o elenco mais completo do país. Mesmo entrando no gramado do Estádio Beira-Rio sem algumas peças importantes de seu esquema (Diego Alves, Diego Ribas, Rodrigo Caio, De Arrascaeta, Gabriel), o time treinado pelo espanhol Domènec Torrent ainda conseguiu suprir tais faltas com jogadores de qualidade, algo que poucos times brasileiros têm conseguido fazer. E ainda assim o Inter forçou erros do adversário e ficou duas vezes na frente do placar, fazendo por merecer o resultado de 2x1. Só não chegou assim no momento do apito final porque, além do óbvio crescimento ofensivo do Flamengo (que poderia até perder, mas venderia caro a derrota), o time não resiste a um pecado, cedendo o empate aos 49 minutos da etapa final.

Não é a primeira vez que isso ocorre em 2020. Palmeiras (empate em 1x1), Bahia (empate em 2x2) e mais recentemente os chilenos da Universidad Católica (derrota por 1x2 pela Libertadores) aproveitaram esse pecado colorado. Há duas semanas, o Athlético-PR por muito pouco também não entrou neste seleto grupo, algo que só não aconteceu porque a mão esquerda de Marcelo Lomba milagrosamente se esticou aos 46 minutos do segundo tempo, lembrando o braço de Michael Jordan no épico final de Space Jam (há rumores de que, após aquela vitória por 2x1, o goleiro saiu canonizado do Beira-Rio).


Não sei se é por desconcentração, desgaste físico, falta de qualidade técnica de alguns jogadores de seu elenco (figuras como Damián Musto e William Pottker ainda têm chances com o técnico Eduardo Coudet, seja por teimosia deste ou por falta de alternativa) ou um misto de tudo isso. Mas sei que os minutos finais de alguns jogos do Inter têm se mostrado verdadeiros testes para cardíacos, fazendo religiosos rezarem o terço inteiro na esperança de que os seres humanos vestidos de alvirrubro no gramado contenham a pressão adversária até a hora do apito final. Uma esperança que tem conduzido à frustração em jogos cruciais.

Ceder o empate no fim do jogo nunca traz boas sensações, mas lógico que empatar com o Flamengo ainda é um resultado normal e plenamente aceitável, ainda mais em um jogo tão disputado, que muitas vezes ganhou tons de batalha épica (aliás, os operadores de som do Beira-Rio perderam a chance de tocar a trilha de Game of Thrones durante a partida). Com quatro gols, bola batendo na trave duas vezes, jogador impedindo gol em cima da linha duas vezes, onze cartões amarelos e até técnicos discutindo à beira do campo (mas exibindo um claro respeito mútuo logo depois disso), o 2x2 entre Internacional e Flamengo que aconteceu ontem foi um jogo notável desse Campeonato Brasileiro, mostrando duas equipes que estão fazendo por merecer a posição em que se encontram na tabela (líder e vice-líder). Mas é claro que, como colorado, torço para que o Inter vá logo confessar seus pecados e não volte a repeti-los tão cedo, já que estes estão custando vitórias importantes em um campeonato que o clube não vence há mais de 40 anos.

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Equação Thomica

O Inter jogava contra o Sport ontem à noite pelo Campeonato Brasileiro. Foi um belo jogo, no qual o Inter agraciou a mim e a outros colorados com uma vitória por 5x3 que ainda marcou o esperado retorno de Rodrigo Dourado, volante que estava há mais de um ano sem entrar em campo. Mas por melhor que tenha sido ver tudo isso, hoje não falarei do jogo em si, mas de um momento bem específico que ocorreu durante ele.

Poucos devem saber sobre essas coisas que irei contar, já que raramente falo sobre meus pais publicamente. Mas acho importante compartilhar ao menos certas características deles a fim de dar sentido a esse post. Sendo assim, devo dizer que meu pai tem o hábito de se mostrar irritado com coisas que muitas vezes são bem simples, exibindo uma reação muito desproporcional (e raramente ele se desculpa por isso). Já minha mãe é uma pessoa sensível, com mais noção quanto aos sentimentos dos outros e que faz questão de mostrar sua indignação com o que vê de errado. E é claro que esses aspectos já renderam grandes discussões, mesmo ficando longe de resumir essas duas pessoas.

Mas voltemos rapidamente à partida. Como podem imaginar pelo resultado, foi um jogo movimentado, de forma que foi inevitável ficar um pouco exaltado com algumas coisas que iam acontecendo, rendendo gritos e reclamações por parte de mim e de meu pai. Estávamos fissurados diante da televisão quando minha mãe se aproximou de nós.

“Me deixa contar essa pra vocês”, ela disse.

“AGORA NÃO!”, respondi em um tom mais alto que o necessário.

Não precisei de muito tempo para notar que pisei na bola. Dois segundos depois, olhei para a cara de minha mãe e ela me encarava com um olhar misto de indignação e decepção que me fizeram imediatamente falar a palavra que precisava ser falada: “Desculpa”.

Eu costumo achar que todos nós, como filhos, devemos ao menos tentar ser pessoas melhores que nossos pais. Isso quer dizer que eles são figuras ruins? De forma alguma. Teoricamente falando, essa busca apenas nos mantém em uma constante evolução como seres humanos. Evolução esta que deverá ser continuada por nossos filhos e depois pelos filhos deles e assim por diante. Mas como essa minha breve cena durante o jogo indica, podemos até tentar ser melhores, mas dificilmente seremos muito diferentes. Foi um raro momento no qual percebi que sou mesmo o resultado da equação de Seu Sérgio e Dona Maria Luiza. Uma soma da exaltação de um e da sensibilidade e empatia da outra. E até que o resultado está num caminho evolutivo satisfatório (ao menos por enquanto).

O mais engraçado foi ter precisado de um jogo do Inter para refletir sobre isso.

sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Poema Difícil


O que fazer quando se quer escrever

Mas não se sabe exatamente sobre o quê?

Aqui a procura por assunto é uma grande constante

Mas devo dizer que a conclusão se mantém distante

Tão distante quanto Porto Alegre é de Sidney ou de Londres


Poucos sabem, mas escrever é difícil

É complicado

Mas eu também não gosto de ficar tão calado

Ao encontrar as palavras até solto fogos de artifício


Mas agora não sei sobre o que escrever,

Só sei que ando sem foco

Do “novo normal” a culpa pode ser

Mas espero que a concentração volte logo

Ando meio cansado de dedicar ela apenas para jogos


Enquanto isso não acontece

E a nação gradualmente padece

Deixo aqui uma simples perguntinha

Afinal, esse negócio não era só uma gripezinha?