terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

Encontrando Palavras

Escrever nem sempre é fácil. Há dias que as palavras surgem com mais naturalidade, mas acho que na maior parte do tempo elas se mantêm escondidas, exigindo um grande esforço para encontrá-las. Muito por conta disso esse blog está sem uma postagem nova há quase um ano (dediquei o tempo de escrita nesse período quase que exclusivamente ao Linguagem Cinéfila, meu blog de cinema).

Mas eis que um filho da mãe na internet alugou um tríplex na minha cabeça ao dizer que “escrever é encaixar palavras”. E agora cá estou eu processando minha indignação através da forma com a qual me expresso melhor e que, como já mencionei algumas vezes, serve quase de maneira terapêutica.

“Encaixar palavras” é uma forma muito ignorante de descrever a escrita. Dizer isso escanteia todo o lado criativo de quem se considera escritor. Porque escrever não é um quebra-cabeça onde as peças do texto já vêm prontas e exigem apenas que a gente raciocine em que lugar cada uma vai. Escrever é um processo por vezes árduo onde nos esforçamos para encontrar as palavras certas para deixar claro aquilo que desejamos, seja ao contar uma história ou ao produzir uma crônica qualquer como essa que você está lendo. Escrever até põe à prova possíveis inseguranças (afinal, será que o que temos na cabeça é válido ou bom o bastante para ser exposto?), e a busca pelas palavras certas nos coloca em batalha constante contra as palavras erradas. E mesmo assim tem horas que o resultado fica longe de satisfazer o autor, mas quem escreve sabe que isso faz parte do negócio.

E exatamente por ter noção disso não consigo evitar de me indignar quando vejo alguém não só falar do processo de maneira tão simplista, mas também fazer isso com o objetivo de defender o uso de inteligência artificial na produção de textos. Isso faz eu pensar cada vez mais que as pessoas, em nome de um maior comodismo, aos poucos deixarão de lado tudo aquilo que manifeste a nossa humanidade.

Mas isso talvez seja um assunto para outra ocasião.

quinta-feira, 30 de março de 2023

Expectativas, Pressões e o Tempo

Semanas atrás assisti ao filme Ela Vai Ter Um Bebê, dirigido pelo John Hughes e lançado em 1988. Para ser sincero, foi um filme no qual apreciei mais as ideias e mensagens que Hughes traz no roteiro do que propriamente a forma como ele trabalha elas na tela. Mas este texto não é uma crítica de cinema. Isso eu deixo para o outro blog (aliás, ultimamente ele tem tido bastante conteúdo, sugiro que confiram). Na verdade, resolvi escrever exatamente sobre essas ideias do filme, que me mantiveram um pouco pensativo.

No filme, Kevin Bacon e Elizabeth McGovern interpretam Jake e Kristy. Quando os conhecemos, eles são dois jovens que estão prestes a se casar. A partir daí basicamente passamos a acompanhar o casal iniciar sua vida juntos, repleta de trancos e barrancos.

Quando digo trancos e barrancos, não me refiro apenas a brigas que imagino que todo casal tem em maior ou menor grau, mas também às inseguranças que os personagens têm em relação as suas decisões, sonhos, insatisfações, planejamentos, futuro... Enfim, inseguranças em relação à vida. Ver Jake e Kristy com tantas dúvidas e preocupações que os fazem viver frequentemente estressados é algo que serve quase como um espelho (ou ao menos serviu para mim). E se pensar essas coisas já é algo que pode ser estressante, acaba piorando quando ficamos matutando o que os outros (pais, amigos, colegas) esperam de nós, muitas vezes olhando um potencial que não conseguimos alcançar por quaisquer motivos.

Tudo isso fez eu pensar sobre como tem sido a minha própria vida em termos do que quero, do que sonho, do que gostaria de já ter alcançado. Minha cabeça chegou a voltar um pouco para a época do ensino médio, quando colegas diziam que eu seria um dos mais bem sucedidos da turma e que eles iriam trabalhar para mim, algo que concluíam apenas porque eu tirava boas notas e era um aluno que andava na linha. Quem dera as coisas fossem simples assim (aliás, se eles soubessem naquela época que eu simplesmente não tenho perfil para ser chefe ou líder de qualquer coisa, creio que ficariam decepcionados).

É claro que não podemos levar tão a sério o que adolescentes têm a dizer sobre a vida, mas lembrar dessa época e constatar que hoje alguns desses colegas estão (ou parecem estar) em fases mais adiantadas é o tipo de coisa que fez eu olhar para os diversos caminhos que podemos tomar, com alguns conseguindo seguir suas rotas com mais naturalidade e menos dificuldades que outros. As coisas são tão complexas que nem posso afirmar com certeza que esses colegas estão adiantados, já que na verdade pode ser que eles apenas estejam na fase que deveriam estar e eu é que me sinto muito atrasado.

Mas o que quero dizer é que nada disso segue necessariamente uma lógica. Às vezes podemos até fazer tudo certinho, e ainda assim vamos nos ver em apuros. Hoje eu me sinto longe de ser um homem adulto realizado e com a vida bem encaminhada. Podemos argumentar que recém tenho 30 anos, ainda é cedo, pouquíssimas pessoas chegam a essa idade tendo tudo pronto. E tais argumentos não estão errados. Aposto que nem meus antigos colegas acreditam que já chegaram no auge. Mas é difícil não sentir uma pressão nos ombros quando olho para o espelho e noto os meus primeiros cabelos brancos enquanto não há expectativas interessantes para o futuro.

Enfim... Pode ser que esse texto tenha ficado todo desconjuntado. E talvez daqui um tempo eu o releia e sinta certa vergonha das palavras aqui utilizadas, como é comum em quase todos os textos que escrevo e publico. Mas esse é o lado bom da passagem de tempo: ela pode nos dar a sabedoria que precisamos para concluirmos como éramos mais tolos e ingênuos.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

Bairrismo Nosso de Cada Dia

(Inspirado em um conceito real)

Porto Alegre. Manhã de segunda-feira.

O jovem repórter sai de casa para a redação. Havia começado a trabalhar no jornal há poucos dias. Seu primeiro emprego na área após anos de estudo. Ficou aliviado por sua mãe conhecer alguém que conhecia alguém que conhecia alguém que sabia de um lugar que estava precisando – ou que ao menos queria dar uma chance a um novato. Não era o melhor veículo, mas era um começo, e ele já estava pegando as manhas do tipo de pautas que eram aceitas ali. Por conta disso, precisava ter em mãos uma grande variedade de acontecimentos ou assuntos. E sabia que ao menos um deveria ser um pouco mais específico que o normal para o agrado do jornal.

Foi o primeiro a chegar na redação. Era um hábito que estava se criando. A qualquer momento um de seus colegas iria perguntar se ele dorme escondido em alguma das minúsculas salas.

Editor-chefe Barros chegou pouco depois. Como sempre cheio de energia e com sua caneca de café em mãos.

“Então, o que temos pra hoje?”, perguntou.

O jovem repórter ainda ficava um pouco nervoso antes de falar. Precisou fingir que checava seu caderninho para que não percebessem a pane em seu cérebro, que durou uns dez segundos até ele finalmente abrir a boca.

“Teve uma prisão noite passada na Zona Sul. A polícia de São Paulo estava atrás desse cara há um tempo. Matou a namorada e vazou pra cá.”

Barros passou a mão na testa.

“A namorada era gaúcha?”, perguntou.

“Pelo que pude apurar até agora, não”, disse o jovem repórter.

“Então vamos pra próxima”.

O jovem repórter olhou rapidamente suas páginas. Um colega entrou na sala nesse meio tempo e olhou surpreso para ele e depois para Barros.

“O guri dormiu escondido aqui?”, perguntou.

“Não”, respondeu o jovem repórter antes de continuar. “Hoje está programado pra acontecer o lançamento de um livr...”

Barros o interrompeu.

“Ah, estou sabendo disso. É daquele escritor carioca de suspenses. Se ele ainda tivesse situado a história do livro aqui pela região a gente até poderia cogitar. Mas não”.

O colega aproveitou a deixa e largou uma sugestão.

“Tem uns gaúchos fazendo excursão na Suécia. Todos devidamente pilchados. Combinei de fazer uma reportagem com eles por vídeo-chamada. O que acha?”. A pergunta foi puramente retórica.

“Opa, manda ver”, disse Barros feliz da vida. “Aliás, vocês viram o amistoso do Arsenal contra a Roma ontem? Tinha um cara com a camiseta do Inter na torcida. Seria um feito conseguir um depoimento dele.”

Depois dessa, o jovem repórter pulou direto pro último assunto que tinha. O único que sabia que tinha chances de ir pra frente.

“Tem uma hamburgueria aqui que se especializou em hambúrgueres de erva-mate”.

Barros imediatamente pareceu interessado.

“Vai lá e faz uma matéria completa, hein?”

segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

Minha experiência com Doom

Um longo caminho capaz de gerar até certo receio de seguir adiante em determinados momentos, mas cujos obstáculos e demônios nós ainda assim enfrentamos. E caso a gente venha a falhar (e somos capazes de falhar várias e várias vezes), podemos tentar novamente ao ganharmos uma nova chance, buscando assim superar os demônios que encontramos.

Eu poderia estar falando da vida, mas estou apenas falando da minha experiência de jogar algo como Doom (de 2016). Sim, acabei de fazer uma analogia comparando a vida a um jogo de tiro em primeira pessoa no qual precisamos enfrentar demônios que estão invadindo a Terra. Aposto que ninguém esperava por isso. Mas entre analogias e tensões, jogar Doom foi uma das experiencias mais... Recompensadoras que pude ter em 2022.

Mas antes de eu me debruçar mais no porquê de eu estar escrevendo sobre isso, quero trazer um pouco de contexto. Quando eu era criança, meu pai encontrava jogos para o computador, e alguns deles eram jogos de tiro em primeira pessoa com um nível de violência relativamente elevado. Três desses jogos acabaram se tornando particularmente marcantes: Duke Nukem 3D (lançado em 1996), Quake (também de 1996) e Doom (de 1993). Por algum motivo que não sei explicar, este último era o que mais me agradava, de forma que lembro de dedicar muitas e muitas horas atirando nas criaturas demoníacas que surgiam em cada fase, mesmo que eu tivesse um pouco de medo e não entendesse nada sobre o que o jogo se tratava.

Corta para 2022 e me vi com vontade de voltar ao universo de Doom após mais de 20 anos sem saber nada sobre a franquia, partindo logo para os jogos mais recentes: o reboot Doom e Doom Eternal (de 2020). Mas meu retorno a esses jogos não foi sem o já citado medo que eu costumava ter, tanto que quando iniciei a primeira fase de Doom numa madrugada de um dia qualquer, eu precisei parar no meio do caminho e sair do jogo, tamanho era o meu estresse a casa passo que eu dava pelo ambiente hostil daquele universo.


Mas, curiosamente, na manhã seguinte acordei determinado a fazer todos os demônios pagarem por terem se metido comigo. Isso fez eu concluir que o terror que eu senti vinha da imagem que eu havia estabelecido quando criança para a série Doom ao invés de vir do jogo em si, que até tem sim um bom nível de tensão e causa sustos quando estamos desatentos, mas está muito longe de ser uma experiência que cause altos arrepios. Na verdade, Doom busca fazer o contrário disso. Não à toa o jogo nos coloca na pele de um personagem que podemos classificar apenas como “fodão”. Tendo as mais diversas armas, uma armadura poderosa e uma vontade inabalável de trucidar demônios, o indivíduo conhecido como Doom Slayer (ou Doom Guy) é uma força difícil de ser parada, fazendo a pessoa que o controla se sentir capaz de qualquer coisa naquele universo.

Esse é o único papel do personagem, que é uma figura temida pelos demônios, mas não ganha muito desenvolvimento para além disso, reforçando a ideia de que ele é o nosso avatar ali dentro. E creio que o fato de o jogador ter um alter ego tão simples, porém tão foda (na falta de outra palavra) sintetiza bem a experiência de jogar Doom. É um jogo que não traz grandes histórias ou grandes objetivos ao longo das fases, mas ainda assim cria um caos divertidíssimo enquanto corremos e matamos instintivamente as criaturas que nos atacam. Todo esse conceito simples é expandido em Doom Eternal, que assim consegue ser uma continuação ainda mais empolgante e insana.


Mas o que me pegou meio de surpresa ao jogar essas maluquices foi ver a diversão desses jogos se misturar com a nostalgia de voltar ao universo de Doom depois de tanto tempo. Acho que foi essa mistura que fez eu me converter oficialmente em fã incondicional dessa série, a ponto de agora eu poder dizer que tenho uma estátua em miniatura do Doom Slayer no meu quarto. Creio que assim os demônios vão pensar duas vezes antes de virem me infernizar.

domingo, 18 de dezembro de 2022

Que final foi essa???


Pouco depois da metade do segundo tempo de Argentina x França, final da Copa do Mundo de 2022, eu comecei a fazer pequenas anotações de coisas que eu poderia utilizar nesse texto. Coisas que poderiam descrever e justificar o que, até aquele momento, era uma vitória tranquila e mais do que merecida da Argentina.

E então chegamos aos 80 minutos de partida (ou 35 minutos do segundo tempo) e precisei jogar fora todas as anotações.

O que ocorreu no Catar foi um jogo que podemos classificar com uma série de adjetivos grandiosos que temos no dicionário.

Épico? Sim.

Catártico? Sim.

Insano? Sim.

Histórico? Não tenham dúvidas de que sim.

As seleções de Argentina e França fizeram algo que não se vê todo dia: transformaram a final da Copa não só no melhor jogo do campeonato (como deve ser), mas também em um jogo que provavelmente será lembrado por muitos e muitos anos pelos admiradores do futebol.


Um jogo que desafiou emoções e até a lógica. Durante 79 minutos, a Argentina mostrava uma vontade digna de campeões e uma organização impressionante, sendo que até o acaso parecia estar jogando ao lado de Lionel Messi e companhia, com tudo dando certo. Quando um jogador argentino chutava a bola para longe de sua área, ela fazia o capricho de desviar em um francês no meio do caminho e sair pela lateral do outro lado do campo. Quando a Argentina estava em plena velocidade no ataque e arriscava um passe, a bola passava sabe-se lá como entre as pernas de um francês. Assim, os argentinos pareciam que iriam levar a taça com serenidade, tendo construído uma vantagem de 2x0 ainda no primeiro tempo (gols de Messi e Di Maria) que os fazia desafiar até mesmo declarações como a do craque francês Kylian Mbappé, que há alguns meses disse que o futebol sul-americano não estava no mesmo alto nível do futebol europeu.

Mas quando chegamos aos 80 minutos de jogo, foi como se os deuses do futebol resolvessem mostrar que existem e tivessem decidido virar a chavezinha que controla a partida. Aos 80 minutos, pênalti para a França e 2x1. Aos 81, 2x2. Os dois momentos protagonizados exatamente por Mbappé, que assim fez a final virar uma apoteose ímpar. E então tudo começou a dar certo para a França. Toda bola rebatida encontrava um pé francês para dominá-la. Se durante a maior parte do tempo os franceses pareciam estar dormindo, nessa hora eles já estavam mais do que acordados. Estavam ligados no 220v, surpreendendo ao ficar mais perto de uma virada do que de uma derrota, o que seria um golpe profundamente duro nos argentinos que tanto dominaram a partida. A essa altura do jogo, mesmo quem não torcia para nenhum dos times era capaz de estar de olhos arregalados.

Os franceses, porém, não souberam aproveitar esse momento de superioridade física e psicológica para matar o jogo, até porque a defesa argentina não permitiu mesmo com o time claramente exaurido em campo. Talvez por isso, durante a prorrogação, os deuses do futebol tenham decidido virar a chavezinha novamente, e Messi aos trancos e barrancos fez 3x2.

Estaria agora a vitória assegurada? A resposta é... Não, já que futebol é um esporte em que mínimos detalhes importam. E mesmo quando você está seguro em campo, administrando bem o jogo e chutando a bola para a torcida para que não aconteça mais nada, um braço estendido do seu jogador dentro da sua área pode colocar tudo a perder. Chavezinha virada novamente, mais um pênalti para a França e 3x3, com Mbappé fazendo um hat-trick e se consolidando como artilheiro da Copa. E o atacante Kolo Muani ainda poderia ter evitado a disputa de pênaltis e dado a vitória aos “Les Bleus”... Isso se não houvesse um gigante chamado Emiliano Martínez preparado para fazer no último minuto o que podemos chamar de “A Defesa da Copa”. E acho que nesse momento, os deuses viraram novamente a chavezinha a favor dos argentinos.


Na loteria dos pênaltis, há dois pontos de vista: ou a França deu o azar de não poder colocar Mbappé em todas as cobranças, ou a Argentina que teve a sorte de contar com Martínez no gol, além de ter tido a competência para converter seus pênaltis. 4x2 e tricampeonato mundial finalmente assegurado. Um título merecido e que não coroa apenas o futebol argentino depois de 36 anos de insucessos em mundiais. Coroa também a genialidade de Lionel Messi.

Já fazem quase 20 anos que Messi encanta o mundo inteiro com seu futebol, seja com um passe, com um gol ou com uma jogada isolada em um canto do campo, fazendo coisas difíceis parecerem simples. Por óbvio, nem sempre o objetivo de levar sua equipe ao gol e, consequentemente, a vitória se cumpriu, principalmente se formos pensar nos últimos anos ou na maior parte de sua carreira na seleção argentina. Mas ele alcançou feitos incríveis, conquistou vários grandes títulos no Barcelona e se estabeleceu como um os melhores jogadores que já pisaram em um campo de futebol (para muitos, ele é o melhor e creio que há vários argumentos para sustentar tal afirmação). Ele conseguiu isso tudo sem ter uma Copa do Mundo, de forma que não ganhar esse campeonato provavelmente não mudaria seu status icônico, com o fracasso sendo uma mera nota de rodapé em sua história. Mas agora, aos 35 anos e se aproximando do fim da carreira, ele conseguiu ao lado de seus companheiros uma Copa para chamar de sua. Uma Copa na qual ele foi eleito o craque com toda justiça. Uma Copa na qual ele marcou gols decisivos em todos os jogos de mata-mata. Uma Copa na qual ele chamou a responsabilidade para si quando o time precisou. Uma Copa que, enfim, acaba com hipotéticas notas de rodapé e traz qualquer que fosse o brilho que faltava para um dos maiores nomes do esporte.

Parabéns, Messi. Parabéns, hermanos. Aproveitem a festa.

sábado, 26 de novembro de 2022

Insegurança e Autossabotagem

Insegurança é uma merda.

Desculpem essa frase de abertura, mas o óbvio às vezes precisa ser dito dessa forma mais enfática, o que não ocorre quando usamos palavras polidas. Portanto... Insegurança é uma merda.

Em março deste ano vi um artigo que escrevi ser publicado em um livro, algo totalmente inédito para mim. Como membro da Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (ACCIRS), contribuí com o projeto literário sobre o cinema gaúcho que o grupo tinha há algum tempo, escrevendo sobre um dos 50 filmes que aparecem naquelas páginas (“50 Olhares da Crítica Sobre o Cinema Gaúcho” é o nome do livro, e eu escrevi sobre O Homem Que Copiava, de Jorge Furtado). Ter feito essa (pequena) contribuição no projeto foi algo que me deu particular orgulho, e provavelmente meus amigos mais próximos tenham sentido minha empolgação quando falei para eles.

Mas... Insegurança é uma merda, e como resultado disso vi apenas alguns familiares irem ao lançamento do livro no início deste ano, além de ninguém que conheço ter ido na sessão de autógrafos que ocorreu semanas atrás na Feira do Livro de Porto Alegre, um dos eventos mais legais da face da Terra. “Mas que amigos desnaturados você tem”, poderiam dizer alguns. O que esses alguns não saberiam é que se quase ninguém que conheço foi prestigiar a mim (e por tabela, claro, a ACCIRS), isso se deve porque eu não convidei direito as pessoas. E fiz isso conscientemente.

Tenho refletido muito nos últimos dias sobre os motivos para eu ter deixado as coisas rolarem dessa forma. Por que me arrependi de ter confirmado presença na sessão de autógrafos? Por que não mandei mensagens para meus amigos convidando todos eles? Por que apenas compartilhei um convite no Instagram sem realmente dizer que fazia questão da presença das pessoas?

Insegurança é uma merda tão grande que me trouxe uma série de sensações que me colocaram para baixo. Uma sensação de que não sou digno de estar entre os autores do livro, de que eu não merecia ser parte de uma associação como a ACCIRS. Uma sensação de que não sou bom o suficiente naquilo que gosto de fazer (escrever, principalmente sobre cinema). Uma sensação de que ninguém iria se importar caso eu não comparecesse ao evento. Uma série de sensação que, basicamente, se baseiam num medo de ser um fracasso, algo que rivaliza com o medo de ser bem sucedido. É um pouco difícil querer dividir esses momentos marcantes com outras pessoas quando a cabeça fica enrolada nessas ideias.

Ainda assim, curiosamente isso não fez eu desistir de ir a sessão de autógrafos. Talvez isso aponte que sou teimoso com o meu lado que gosta de uma autossabotagem (ou que eu apenas goste de cumprir com meus compromissos). E para a minha surpresa... Essas sensações sumiram quando me juntei aos meus colegas e coautores. Foi uma sessão de autógrafos tranquila, onde tudo correu melhor que o imaginado. E consequentemente isso fez eu me arrepender de não ter convidado as pessoas apropriadamente para que o evento tivesse sido ainda melhor.

Comecei a escrever isso mais como um desabafo, levando a sério a ideia que tive ao criar esse blog para “arquivar” as abobrinhas que passam pela minha cabeça. Se você chegou até essa parte do texto, gostaria de informar que eu até que sou bom dando conselhos para amigos, apesar de eu mesmo não poder dizer que sigo estes conselhos. Mas talvez lendo e imaginando que outra pessoa deu estes conselhos isso mude um pouco. Por isso, digo que devemos procurar acreditar mais em nosso potencial, nos orgulhar plenamente de nossas conquistas e compartilhar o máximo que pudermos com as pessoas que amamos. Vai saber? Podemos estar perdendo de deixar bons momentos ainda melhores.

quarta-feira, 7 de setembro de 2022

Bem-vindo, Toco 3.0!

Ao longo dos últimos anos, vi uma aura especial se moldar ao redor da chegada do 30º aniversário das pessoas. Não sei se só eu tive essa impressão ou se foi algo comum à minha geração (e talvez das gerações anteriores) de modo geral, mas a ideia de chegar aos 30 parecia ser semelhante a chegar aos 18 anos, como se fosse alguma nova marca de maioridade. Até mesmo Friends, há mais de duas décadas, realizou um episódio no qual Rachel completava 30 anos e, de quebra, nós tivemos a oportunidade de ver como os outros personagens chegaram a essa idade. Por conta desse episódio, eu basicamente esperei pelo dia de hoje apenas para repetir o que o grande Joey Tribbiani grita em determinada cena.

“Por que, Deus? Por quê? Nós tínhamos um acordo. Deixe os outros ficarem velhos, não eu!”


O interessante é que eu até posso compartilhar essa cena e satisfazer todo o tempo de espera pelo qual passei para poder usá-la, mas não posso dizer que ela reflete meus reais sentimentos nessa chegada aos 30. Não por eu não ser nada religioso e, por isso, não curtir ficar clamando coisas pra um cara cuja existência eu não consigo dizer que acredito. Mas sim porque acho que já faz um tempo que deixei de ver o processo de envelhecimento como algo negativo ou particularmente pesado.

Já devo ter dito em alguma outra ocasião, mas eu gosto da ideia de que somos todos projetos em desenvolvimento, e a passagem de tempo (somada aos diversos contextos e fases pelas quais passamos) surge como uma oportunidade para tentarmos evoluir gradualmente como seres humanos. Falando por mim, é óbvio que jamais deixarei de ter falhas, mas diante de todo esse processo acho seguro dizer que sou um cara mais legal do que era há alguns anos (ou no mínimo menos idiota), e espero poder voltar a dizer isso quando eu chegar aos 35, aos 40 e assim por diante. Da mesma forma, espero continuar evoluindo ao lado de todas as pessoas queridas que tenho mantido por perto, já que elas contribuem para que os obstáculos da vida e as injustiças do mundo fiquem um pouco mais suportáveis.

Assim dou boas-vindas ao Toco 3.0, esperando que ele tenha sorte e sensatez em sua volta ao redor do Sol.