“[...] Julgá-lo era fácil, e era
fácil condená-lo, mas não era tão fácil esquecer que Maradona vinha cometendo
há anos o pecado de ser o melhor, o delito de denunciar de viva voz as coisas
que o poder manda calar e o crime de jogar com a canhota, que segundo o Pequeno
Larousse Ilustrado significa ‘com a esquerda’ e também significa 'o
contrário de como se deve fazer’.
Estava esgotado pelo peso de sua
própria personagem. Tinha problemas na coluna vertebral, desde o longínquo dia
em a multidão havia gritado seu nome pela primeira vez. Maradona carregava uma
carga chamada Maradona, que fazia sua coluna estalar. O corpo como metáfora:
suas pernas doíam, não podia dormir sem comprimidos. Não tinha demorado a
perceber que era insuportável a responsabilidade de trabalhar como deus nos
estádios, mas desde o princípio soube que era impossível deixar de fazê-lo. ‘Necessito
que me necessitem’, confessou, quando já tinha há muitos anos o halo na cabeça,
submetido à tirania do rendimento sobre-humano, intoxicado de cortisona,
analgésicos e ovações, acossado pelas exigências de seus devotos e pelo ódio dos
que ofendera.
Quando Maradona foi, finalmente,
expulso do Mundial de 94, os campos de futebol perderam seu rebelde mais
clamoroso. E perderam também um jogador fantástico. Maradona é incontrolável quando
fala, mas muito mais quando joga: não há quem possa prever as diabruras deste
criador de surpresas, que jamais se repete e goza desconcertando os
computadores. Não é um jogador veloz, tourinho de pernas curtas, mas leva a
bola costurada no pé e tem olhos em todo o corpo. Seus malabarismos inflamam o
campo. Ele pode resolver uma partida disparando um tiro fulminante de costas
para o gol ou servindo um passe impossível, de longe, quando está cercado por
milhares de pernas inimigas, e não há quem o pare quando se lança a driblar
adversários.”
Obrigado por ter compartilhado
seu talento futebolístico com o mundo, Don Diego. Descanse em paz.
(30 de outubro de 1960 – 25 de
novembro de 2020)
Um comentário:
Bela homanagem, bro.
Vá em paz, Maradona!
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