quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Visitando a História de Sobrevivência nos Andes


Julho de 2017. Pela primeira vez eu fui visitar outro país. Na ocasião, eu e minha irmã entramos em um ônibus a caminho de Montevidéu, a bela capital uruguaia, onde chegamos depois de doze horas de viagem. Foram quatro ótimos dias turistando, conhecendo a cultura e o ambiente uruguaio e criando boas histórias para contar. Sem dúvida é uma viagem que pretendo repetir outras vezes, até porque quatro dias ainda é pouco tempo e não foi possível conferir tudo o que a cidade tem a oferecer. Talvez no futuro eu escreva um post mais abrangente sobre esses dias, mas no momento quero me focar apenas em uma das partes que mais gostei na viagem: a visita ao Museu dos Andes.

Para quem não sabe, em 13 de outubro de 1972, um avião saiu de Montevidéu a caminho da capital chilena, Santiago. Entre os 45 passageiros, estavam os membros de um time uruguaio de rugby chamado Clube dos Cristãos Velhos, além de seus familiares, amigos e a tripulação. No Chile, o time estava programado para jogar uma partida contra uma equipe britânica, algo que não aconteceu porque, após um erro dos pilotos causado pelas péssimas condições climáticas, o avião acabou caindo na Cordilheira dos Andes. Das 45 pessoas a bordo, 33 sobreviveram à queda, mas muitas tiveram ferimentos graves e morreram nos dias seguintes. Sem ninguém para resgatar o grupo, foi iniciada uma verdadeira luta pela sobrevivência, o que durou 72 dias e fez com que as pessoas se alimentassem da carne de seus falecidos entes queridos, no ponto que mais marcou a tragédia e mostra como a situação era desesperadora. O caso teve conclusão depois que dois membros do time, Fernando Parrado e Roberto Canessa, corajosamente atravessaram a cordilheira por dez dias e conseguiram ajuda. No final, 16 pessoas sobreviveram e voltaram para casa.



A história foi contada em vários livros, sendo que o mais famoso deles talvez seja Os Sobreviventes, escrito pelo britânico Piers Paul Read e publicado em 1974. Já o Museu dos Andes foi concebido não só para preservar a memória de uma tragédia que causou grande comoção no Uruguai, mas também para honrar as vidas que foram perdidas tanto no acidente quanto nos dias que se sucederam. Dizer que curti essa parte do passeio por Montevidéu talvez nem seja a melhor forma de definir a sensação durante a visita ao museu, já que podemos sentir um certo embrulho no estômago só de saber que uma situação como essa ocorreu. Mas ainda que seja algo difícil de digerir, acho importante ter conhecimento de histórias desse tipo, até para saber o que o ser humano é capaz de fazer em situações extremas. Nessa visita ao Museu dos Andes, eu e minha irmã nos deparamos com um silêncio que parecia querer ressaltar o impacto daquele acontecimento. Isso enquanto caminhávamos por ambientes que traziam vários itens do acidente (como partes do avião), assim como resgates históricos interessantes (como uma linha do tempo que mostra o que acontecia no mundo enquanto os sobreviventes estavam na cordilheira).





Meses depois da viagem (repito: meses), eu estava checando os livros mais antigos que estavam na estante da minha casa quando notei um em especial: uma edição de 1983 de Os Sobreviventes. Sim, o livro que relata a história pela qual tanto me interessei estava bem debaixo do meu nariz, fazendo parte da pequena coleção de livros dos meus pais desde antes de eu nascer. Sendo meu pai um piloto de avião (hoje aposentado), em algum momento de sua vida ele se interessou pela história e adquiriu o livro, de forma que fiquei um pouco indignado por ele não ter avisado da existência deste exemplar quando eu e minha irmã falamos da viagem. Mas indignações à parte, é claro que não perdi muito tempo e peguei o livro para ler.

Mesmo que Piers Paul Read seja britânico e, portanto, tenha acompanhado o caso à distância na época, podemos ver ao longo das páginas que ele fez um trabalho de pesquisa impressionante, entrevistando os envolvidos e ficando por dentro de tudo sobre o acidente. Sendo assim, o que se vê em Os Sobreviventes é um relato bastante detalhista sobre a queda do avião e os 72 dias que as pessoas ficaram na Cordilheira dos Andes. O autor também estabelece bem o contexto da época do acidente e mostra toda a logística por trás das tentativas de resgate por parte do governo, além de explorar os efeitos que aqueles dias tiveram (e acredito que ainda tenham) nos sobreviventes. Essencialmente, o que temos aqui é uma história de superação e esperança, e o autor merece créditos por conseguir contar tudo isso sem amenizar o peso dos acontecimentos e das difíceis decisões tomadas por aquelas pessoas. Read até avisa no prefácio que não romanceou nenhuma passagem do livro, permitindo que os fatos causem impacto por si mesmos.

Em 1993, o livro foi adaptado para o cinema pelo diretor e produtor Frank Marshall em Vivos, filme que trouxe Ethan Hawke e Josh Hamilton nos papeis de Fernando Parrado e Roberto Canessa, respectivamente. Apesar de contar com bons momentos e um elenco esforçado, o longa não chega a ter uma narrativa que reflita o peso emocional da história. Os Sobreviventes, porém, se mantém como um livro instigante e bastante completo sobre uma tragédia que o povo uruguaio jamais vai se permitir esquecer, ao passo que o Museu dos Andes é um ponto turístico que merece ser visitado.

3 comentários:

Bruno Farinon disse...

WOOOOW! Tá aí uma história incrivelmente estarrecedora. E o ponto que tu colocou, sobre encontrar em histórias como essa sinais de como se comportam os seres humanos em situações extremas, é o que mais me move sobre isso tudo. Eu me pergunto: Que tipo de mudança psicológica essa situação provocou nessas pessoas?
É uma ótima maneira de se lembrar de uma viagem como essa, a uma cidade tão linda e gostosa como Montevideo
Abração!!!

Alan Noronha disse...

Eu escuto essa história há tempos, e mesmo tendo passado tanto tempo em Montevideo, nunca visitei o museu. Bom programa para a próxima.

Mila disse...

Nossa, que estômago para ler esse livro. Não sei se tenho, mas fico curiosa igual haha