sexta-feira, 26 de março de 2021

A Primeira Vez no Beira-Rio

Houve um momento em que olhei para o meu pai e disse a ele que eu seria gremista.

O ano era 2002. Nós morávamos em Bento Gonçalves, o Brasil havia acabado de conquistar o pentacampeonato mundial e o Inter lutava para escapar do rebaixamento no Campeonato Brasileiro, enquanto que o Grêmio vivia seus bons dias sob o comando de Tite (naquele ano, foram semifinalistas tanto no Brasileirão quanto na Libertadores). Neste contexto, no qual eu mal acompanhava futebol, alguns amigos da escola diziam que o Grêmio era melhor e que o Inter era horrível, o que admito ter feito um pouco a minha cabeça. Porém, quando falei ao meu pai que eu iria ser gremista ele logo me cortou. Mas não me importei nenhum pouco de continuar sendo colorado, até porque eu já estava mais do que acostumado a me identificar dessa forma.

Depois que voltamos a morar em Porto Alegre, algo que ocorreu no final daquele ano, surgiu a ideia de ir ao Beira-Rio assistir a um jogo, até porque eu havia começado a gostar muito de futebol (coloco a culpa disso nas famosas pedaladas de Robinho). Não lembro se a ideia partiu de mim ou de meu pai, mas ela certamente serviria para fincar meus pés no lado vermelho da Força. Tentando fazer a ideia sair do papel, sugeri que fossemos a um Gre-Nal, mas meu pai colocou uma condição superprotetora: a gente deveria ir num jogo que não envolvesse rivalidade. Ele achava que jogos assim tinham mais chances de rolar violência entre torcidas e não queria me ver nesse tipo de situação. Convenhamos, a preocupação dele não era descabida (mesmo hoje ela não seria).

Com isso em mente, eu vi passar na televisão o comercial do jogo do Inter contra o Remo (do Pará), que se enfrentariam pela segunda fase da Copa do Brasil de 2003. Seria o jogo da volta na disputa entre os dois clubes, com o Inter precisando reverter uma vantagem do Remo, que havia vencido o jogo de ida em Belém por 1x0. Se não me engano vi o comercial em um domingo e o jogo seria na quarta-feira à noite. Olhei para o meu pai e ele topou quase imediatamente.

Quando chegou o dia, lamentei não ter uma camisa do time para poder ir ao estádio. Mas coloquei uma camiseta preta comum e, junto com meu pai, saí de casa rumo ao Gigante da Beira-Rio (aliás, nessa época eu já gostava demais de poder chamar o estádio de Gigante). Chegamos lá depois de dois ônibus e uma breve caminhada, sendo que esta última parte do trajeto já fez eu ir curtindo aquele ambiente do jogo, vendo várias e várias pessoas de vermelho e branco indo para o mesmo lugar que eu e com o mesmo propósito. Na bilheteria meu pai comprou seu ingresso, momento no qual pude apreciar um pouco a vantagem de ser criança: eu entrava de graça.

Com ingresso da arquibancada inferior comprado, finalmente entramos no estádio. Foi então que, após a bela expectativa criada pela escada que dá acesso a arquibancada, me vi diante do campo e de toda a torcida, uma imagem que me encantou bastante. Até hoje, subir as escadas e dar de cara com isso é o meu momento favorito de ir ao Beira-Rio. Eu e meu pai nos ajeitamos no concreto da arquibancada enquanto mais torcedores chegavam e preenchiam os espaços do estádio. Nesse meio tempo, estava rolando um jogo no campo. Se bem entendi, o Inter permitia que torcedores marcassem uma partida amistosa antes do evento principal, algo que não se vê mais hoje em dia. E era divertido ver “pessoas comuns” se aventurando naquele gramado.

Terminado isso veio a hora do jogo e aos poucos me vi aprendendo a torcer. Sem nunca ter estado naquele ambiente, eu praticamente fui apenas imitando as coisas que eu via ao meu redor. Sendo assim, quando as escalações apareceram, aplaudi cada nome colorado que foi anunciado nos autofalantes do estádio e vaiei (timidamente) os nomes do time adversário. Durante a partida, me mantinha sentado durante lances desinteressantes, mas vi que podia me levantar quando havia uma chance de gol. Quando Daniel Carvalho pegava na bola e partia para o ataque, eu falava “Vai, Daniel! Vai, Daniel!” da mesma forma que um torcedor que estava próximo de mim falava, até porque Daniel Carvalho era o único jogador do Inter que eu sabia dizer quem era naquele momento. E pontualmente eu olhava para trás, já que acabei ficando preocupado após meu pai falar que torcedores têm o hábito de jogar copos de xixi nas pessoas que se encontram em pé mais à frente (até hoje nunca vi isso acontecer, mas era bom se precaver).

Já a partida em si eu lembro de ter gostado. Não foi um jogo chato de assistir, já que valia uma classificação para a fase seguinte da competição. Aos 27 minutos do primeiro tempo, o atacante André abriu o placar para o Inter. Mas aos 3 minutos do segundo tempo, Ivan empatou para o Remo, complicando mais a vida colorada. Ficamos na frente do placar novamente quando o zagueiro Sangaletti ganhou uma disputa com os defensores adversários, aos 19 minutos. Depois disso, vimos todas as grandes chances que criávamos pararem nas mãos do goleiro Ivair, que virou um paredão embaixo das traves (ao longo dos anos pude notar que isso acontece bastante com goleiros adversários no Beira-Rio). O jogo acabou 2x1. No placar agregado, 2x2, mas o gol feito fora de casa deu a classificação ao Remo.


A partida ocorreu no dia 26 de março de 2003. Ou seja, fazem exatos 18 anos que uma noite frustrante para o clube ainda assim foi empolgante para uma criança que fazia sua primeira excursão pelo Beira-Rio. Desde então, trocar de clube do coração nunca mais surgiu como opção. Sinto orgulho nas conquistas e tristeza nas derrotas, seja com os ouvidos grudados em um radinho, com os olhos atentos a uma televisão ou marcando presença no Gigante. E como diria um cântico da torcida: não importa o que digam sobre o Inter, sempre o levarei comigo.

Um comentário:

mila disse...

nossa, me arrepiei aqui, lembrando da primeira vez que eu me lembro de ir no estádio do botafogo. eu já tinha ido pequena mas não lembrava. Aqui no RS meu pai não me levava (porque não era o Botafogo), mas quando fomos para o Rio uma vez, meu pai botou eu e meu primo num carro e lá fomos nós pro estádio.
foram experiências diferentes, mas as sensações que você descreveu foram iguais...

olha só, você me fez ficar emocionada com um texto de futebol hahahah